sexta-feira, 30 de abril de 2010

Mahmoud, um desabafo.

(desabafo escrito à epoca do golpe militar em Honduras, finalmente vem a público mesmo com o risco de abalar a política mundial)

Todos os blogueiros do mundo estão falando sobre a morte de Michael Jackson. Mas nós do Um Ponto e Outra Palavra, doravante apenas UPOP, vendo as coisas do altíssimo terraço de nosso conglomerado comercial, evitaremos espezinhar piadinhas infames ou falatórios sobre aquelas coisinhas que, assim como alguns padres, ele gostava de fazer com criancinhas, por exemplo, orar. O rei está morto, viva o rei, acabou nossa homenagem.

Na verdade, temos outra coisa para comentar no momento. Sabemos que Mahmoud Ahmadinejad, presidente do Irã, acompanha com grande afinco nosso trabalho, prova disso é seu olhar apreensivo desde que o UPOP foi lançado, em alto contraste com aquela face frondosa e alegre de outros tempos.

Pois bem. Diretamente daquele país, aliás, de gente honesta e trabalhadora, gente de bem, nosso correspondente nos mandou algumas notícias via mensagem de celular. Ficamos sabendo que a internet por lá anda bloqueada para a maioria da população. Que desumano. Por que deixar os demais iranianos sem esse privilégio?

Fica aqui registrado nosso repúdio a tal atuação antidemocrática por parte de V.Exa, Sr. Mahmoud. Aliás, ficamos tão profundamente magoados com esta situação que vamos nos dar o luxo de discordar, também, do assassinato daquela mocinha que falava umas coisas sobre vosso governo. E não estamos nem aí se nossas bravas declarações afetarão vosso mercado ou vossa relação com os Estados Unidos do Obama. Da próxima vez, pense melhor.

Fora isso, tranquilo. Aqui nas Américas a coisa andou esquentando por conta de um golpe militar em Honduras. Também repudiamos esse fato, pois somos a favor da democracia, e deixamos isto bem claro durante nosso costumeiro café de terça-feira, fato pelo qual fomos merecidamente elogiados pelo Sr. Hugo Chávez, que, seguindo nossas orientações, está seriamente pensando em intervir no caso.

O leitor nos desculpará o desabafo. Mas alguém tinha que fazer alguma coisa.

terça-feira, 27 de abril de 2010

Noites de Bagdá

(minicrônica antiga e cretininha só pra não ficar sem postagem)


O Mauro estava bêbado e queria beber mais. O Fusca (também bêbado) se aproximou dele e deu-lhe conselhos. Não faça isso, olha tua saúde, o que os outros vão pensar etc etc. O Mauro, que realmente estava muito bêbado, aceitou os conselhos do Fusca. Convenhamos que o Fusca não seja lá o sinônimo de bom conselheiro ou de rapaz provido de retidão. Não se controla nas festas nem é lá assim um senhor maturidade. Mas o Mauro, além de aceitar os conselhos, agradeceu e disse ao Fusca que ele era um grande amigo, que tinha sido importante ouvir as palavras dele.


Pois o Mauro, uma semana depois, estava severamente arrependido.


- O Fusca é foda.


- Porque?


- Eu tava lá no Mundo, conversando com umas amigas. Ele chegou, tava bêbado, o desgraçado, me puxou e disse “você consegue coisa melhor, Mauro. Na boa.” Na frente das meninas.


- Puts.


- E as gurias com aquela cara.


- Puts!


O caso é que o Fusca começou a sentir-se como o protetor do Mauro. O Mauro não podia espirrar que o Fusca lascava um conselho. Outro dia, no Bagdá, o Mauro estava tocando com a banda dele. No intervalo, chega na mesa. O Fusca só olhando. O Mauro acende um cigarro. O Fusca faz cara de quem não aprovou, embora também seja fumante. Mas se contém. Alguém pergunta da banda. O Mauro vai responder, o Fusca corta:


- Eu acho que o Mauro tinha que se impor mais.


- Ãn?


- É, mostrar que ele é o cabeça da parada. Você tem capacidade pra isso, viu, Mauro?


- Do que você ta falando?


- Eu sei que você curte um som assim-assado. Devia impor pros caras. Acredita no teu som, meu!


O Mauro termina o intervalo e volta pro palco. O Fusca lá, olhando, dessa vez com cara de quem está vendo o filho aparecer em público pela primeira vez.


- O Mauro é como um irmão mais novo pra mim. Gosto desse cara.


- Mas você é mais novo que ele.


- Nada a ver.


E agora o Mauro tem que ficar aguentando o Fusca e suas filosofias e psicologias. Como normalmente o Fusca está consideravelmente (muito) mais bêbado que o Mauro, isso tem se tornado um problema.

domingo, 25 de abril de 2010

Uma Noite Ímpar


(crônica de estilo descaradamente cretino)

I. Da introdução

Quando um bar está muito cheio, normalmente as pessoas esperam um pouco até liberar uma mesa. Não demoraria demais, não havia muita gente de pé. Mesmo assim, o outro bar tinha uns amigos cuja companhia me agrada.

II. De uma lembrança

Quanto eu tinha uns 16 anos, frequentava festas de rock. Muita gente de preto, muita bebida, muito rock mal tocado.

III. De outra lembrança

Um ex amigo me emprestou um CD, o qual não devolvi no prazo estipulado.

IV. Do outro bar

Muita gente de preto. O blues é bem tocado. Um primeiro bêbado tenta se apoiar numa lixeira. No chão, o primeiro bêbado e a lixeira. Estou conversando com um homem que tem cabelo de um lado e é careca do outro. O bigodinho é novo: eu digo que lembra Hitler. Ele observa que seis pessoas já disseram isso, que ele está fazendo uma contagem. Outros disseram que ele parece Chaplin. Que se eu via Hitler eu deveria repensar as coisas pelas quais me interesso. O primeiro bêbado se aproxima: “desculpa, não queria incomodar... é foda... tô de cara... mulher, você sabe, é foda... tô de cara”. É foda.

V. De um adendo à outra lembrança

O ex amigo tem amigos. Muitos. Roqueiros. Que sabem que não devolvi o CD. Vestem preto.

VI. De um sufoco

Existe um caixão encostado numa parede. A namorada do amigo entra no caixão e sai rápido: “sufoca”, observa.

VII. De um pingente

Um homem se pendura na luminária. É o homem que Chaplin me apresentou como dono do bar. Ele está pulando em cima da bancada de atendimento. Os clientes vão ao delírio. A banda vai ao delírio. Ele vai ao delírio. Ele bate a cabeça no teto. Eu vou ao banheiro.

VIII. Do banheiro

Nos acampamentos, banheiros e cinzeiros são o mundo todo: um carreirinho por entre o matagal que abre numa clareira. Eis o banheiro do bar. Existe outra opção: aguardar uns 40 minutos no único banheiro construído para esse fim. Unissex.

IX. De um temor

“Talvez eu morra”. Este é o tom da mensagem de celular que enviei.

X. De uma gordinha

Estou voltando do caixa para a mesa onde estava sentado. Há duas portas. Pretendo sair pela porta da esquerda. Uma gordinha dá um passo à esquerda. Desvio. Ela dá outro passo à esquerda. Passo.

XI. De uma expulsão

Um homem não seguiu as regras do bar (desconheço). É expulso gentilmente.

XII. De uma observação pertinente

“É o que dá se envolver com juvenil”, diz a namorada do expulso.

XIII. De um intelectual

Chaplin está lendo um livro de Paulo Leminski num canto do bar.

XIV. De um esportista

A multidão se abre. Não é briga. Chaplin passa pedalando (!) em meio à multidão.

XV. De uma decisão

Vamos embora.

XVI. Do primeiro bar

Um homem grita na mesa de trás. “Essa não, essa me faz lembrar minha amada. Aí eu tenho vontade de chorar. Toca outra, toca outra”. A dupla prossegue.

XVII. Da quase conclusão

Um carro está batido num poste. Volto para verificar se o motorista está vivo. Está vivo. E bêbado. E ao celular. “Bati o carro num poste, pô. Bateu, tá batido. Não estou te ligando pra ouvir opinião. To sozinho, agora chegou uns amigo meu aqui”. Pra mim: “mulher é foda.”

XVIII. Da conclusão

Vou abrir um blog.